Publicado em 05/03/2025, 20:10h

A violência cometida contra opositores do regime militar é personificada na tragédia de Rubens Paiva, ex-deputado cassado pelo golpe de 1964. Paiva foi preso em 1971 por agentes da repressão, levado ao DOI-Codi do Rio de Janeiro e brutalmente torturado. Sua família nunca recebeu uma explicação oficial sobre seu paradeiro, e por décadas, seu desaparecimento permaneceu um dos símbolos mais cruéis da violência do regime. Em 2014, a Comissão Nacional da Verdade confirmou que ele foi morto sob custódia do Estado. O caso de Rubens Paiva ilustra a brutalidade de um período marcado por perseguições, censura e tortura.

A história contada em Ainda Estou Aqui, vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro de 2025, é um lembrete essencial de que, apesar das tentativas de apagamento histórico, as memórias da resistência e da luta por direitos humanos continuam vivas. O filme agora entra para a lista das grandes obras cinematográficas que denunciam regimes autoritários, e que celebram a coragem daqueles que ousaram desafiar esses regimes brutais. Que não se calaram ou se acovardaram.

Rubens Paiva, político e engenheiro, como eu, se destacou como deputado federal não apenas por suas convicções democráticas, mas também por sua notável capacidade oratória. Ele possuía um discurso firme, articulado e apaixonado, características que o tornaram uma voz influente na defesa das liberdades civis e no combate ao autoritarismo. Sua oratória era marcada por clareza e persuasão, qualidades que lhe permitiam enfrentar debates acalorados no Congresso Nacional. Seu talento como orador reforçou seu papel como um líder político comprometido com a democracia, tornando-se uma figura emblemática da resistência ao regime militar. Um dos seus discursos mais emblemáticos no congresso nacional mostra esse compromisso. Um registro histórico em defesa das pretendidas reformas do ex-presidente João Goulart.

Rádio nacional do Rio de Janeiro de plantão pelo Brasil, comandando uma grande rede de emissoras integradas na Guanabara, pela rádio Ministério da educação e cultura, em São Paulo, pela rádio nacional de São Paulo e em Brasília pela rádio nacional do Distrito Federal, além de muitas outras emissoras do interior, as quais inclusive pediríamos a gentileza de telegrafar, enviando os seus prefixos para que pudéssemos mencioná-los aqui e senhoras e senhores, continuando com esta série de depoimentos ao microfone da rádio nacional do Rio de Janeiro.

Nesta madrugada de primeiro de abril vamos trazer o deputado Rubens Paiva, representante do estado de São Paulo no Congresso Nacional.

Meus patrícios, me dirijo especialmente a todos os trabalhadores, a todos os estudantes e a todo o povo de São Paulo, tão infelicitado por este governo fascista e golpista que neste momento vem traindo o seu mandato e se pondo ao lado das forças da reação.

Desejo conclamar todos os trabalhadores de São Paulo, todos os trabalhadores portuários e metalúrgicos da baixada santista, de Santos, da capital e das cidades industriais de São Paulo, em especial todos os universitários, que se unam em torno dos seus órgãos representativos.

Obedecendo a palavra de ordem do comando geral dos trabalhadores, do fórum sindical, de debates dos sindicatos da união nacional, dos estudantes das uniões estaduais e dos grêmios estudantis, para que todos em greve geral deem a sua solidariedade integral a legalidade que ora representa o presidente João Goulart, o nosso presidente, ao tomar as medidas, estão reclamadas por todo o nosso povo. Medidas que nos conduzirão, indiscutivelmente, a nossa emancipação política e econômica definitiva. Realmente prejudicou os interesses de uma pequena minoria de nossa Terra. Pequena minoria, entretanto, e detém um grande poder.

Todo o poder econômico deste país, todo os órgãos de divulgação, os grandes jornais e as estações de televisão. É indispensável, portanto, que todo o povo brasileiro, os trabalhadores e os estudantes de São Paulo, em especial, estejam atentos às palavras de ordem que emanarem aqui da rádio nacional e de todas as outras rádios que estejam integradas nesta cadeia da legalidade. Julgamos indispensável que todo o povo se mobilize, tranquila e ordeiramente em defesa da legalidade, prestigiando a ação reformista do presidente João Goulart.

E neste momento, está com o seu governo empenhado em atender a todas as legítimas reivindicações de nosso povo. É indispensável que se processe de uma vez por todas a divisão da Riqueza brasileira entre todos os seus habitantes. Não é possível que nós tenhamos marginalizados mais da metade dos habitantes deste país, mais da metade dos habitantes do Brasil sem condições de trabalho. Sem saber de manhã para que local se dirigirem para ganhar o seu pão e alimentar a sua família? É uma estrutura de reforma. É exatamente com as medidas preconizadas pelo governo federal que teremos condições realmente de integrar todos os brasileiros neste processo. E com isto, lucram os trabalhadores que terão maiores condições de emprego. Com isso, lucram os industriais que terão a quem vender os seus produtos, com isto lucram os comerciantes.

Toda a população deste país. O que se diz? Que o governo pretende acabar com o direito de propriedade? Estabelecer o confisco de tudo o que existe como propriedade privada é uma grande mentira. É uma grande farsa. O que se pretende realmente, trabalhadores e estudantes de São Paulo, é tornar este governo incompatibilizado com a opinião pública sobre uma onda de mentiras, de uma imagem deformada.

O presidente João Goulart em suas reformas visa tão somente dar ao povo brasileiro uma participação na Riqueza deste país. Este momento nacional é o momento decisivo em que o povo brasileiro pode ter a Felicidade de ver realizado. Visa tão somente dar ao povo brasileiro uma participação na Riqueza deste país. Este momento nacional é o momento decisivo em que o povo brasileiro pode ter a Felicidade de ver realizada toda a sua revolução dentro do processo da legalidade democrática, prestigiando o presidente da República. E esta legalidade é indispensável, entretanto, para isto e o presidente?

E o governo? Contem com toda a mobilização da opinião pública, todos os trabalhadores, todos os estudantes, os intelectuais e o povo em geral para que pacífico e ordeiramente digam um não e um basta a esses golpistas que pretendem cada vez mais prestigiar. A pequena minoria privilegiada está lançada inteiramente para todo o país. O desafio, de um lado, a maioria do povo brasileiro desejando as reformas e desejando que a Riqueza se distribua ao lado da legalidade do presidente João Goulart. Os outros são os golpistas que devem ser repelidos e desta vez, definitivamente, para que o nosso país veja realmente o momento da sua libertação raiada.

Muito obrigado. Tivemos assim o depoimento do deputado Rubens Paiva, do PTB de São Paulo.

Pesarosamente e só recentemente ficamos sabendo de que forma o corpo de Rubens Paiva, após o seu assassinato pelo Estado, foi ocultado, e negado aos seus familiares o direito de o sepultar de forma humana, digna.

Conforme notícia do Diário do Centro do Mundo (DCM), e também do Intercept Brasil, o corpo de Rubens Paiva foi lançado ao mar preso numa roda de caminhão, conforme revelou um ex-militar. Uma brutalidade sem fim. Uma desumanidade.

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