De Política em Debate

Publicado em 13/04/2025, 20:15h

Na última sexta-feira (11/04), o governo de Donald Trump anunciou uma reviravolta em sua política tarifária, isentando smartphones, computadores e outros componentes eletrônicos das tarifas de até 145% impostas sobre produtos chineses. A decisão, que inicialmente parece um alívio para consumidores e para os gigantes da tecnologia, como Apple, levanta questões críticas sobre a coerência e os objetivos reais da estratégia comercial de Trump.

Na verdade, o recuo foi humilhante, já que o ufanista Trump vinha alardeando que não recuaria, quase pedindo para Xi Jinping pedir para negociar com ele, dizendo ser amigo de Xi Jinping e que o líder chinês faria o que fosse melhor para seu povo, já que o amava. Não. Não colou. Trump ainda vinha alardeando que 75 países querem negociar com os Estados Unidos a questão das tarifas. Vindo “beijar a sua bunda”. É sério. Ele falou isso. Muito educado. Muito fino. Na verdade é a expressão do Trump adora fazer: humilhar chefes de Estado. Assim como fez com Zelensky em plena Casa Branca.

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Cabe lembrar ainda que Trump, em recuo anterior, já tinha reduzido as tarifas para todos os países do mundo, menos para a China, para 10% por 90 dias. De recuo em recuo Trump vai perdendo a sua credibilidade. Expondo as fraquezas de um líder autoritário, ignorante no que concerne à complexidade da economia globalizada, suas interdependências e nuances.

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A Contradição na Retórica Antichina

Desde o início de sua administração, Trump tem martelado a ideia de que os Estados Unidos precisam reduzir a atual dependência da China em relação a produtos com tecnologias críticas, como semicondutores, chips e dispositivos eletrônicos. Essa política de repatriação da capacidade industrial produtiva perdida vem, na verdade, desde Barack Obama, passando por Trump 1.0, Joe Biden e agora Trump 2.0, e visa, além de aporte de investimentos maciços para inovação tecnológica e produção made in usa, de componentes de alta tecnologia, também trazer de volta para os Estados Unidos, por exemplo, a cadeia produtiva de automóveis, desde a produção de aço, alumínio, ligas especiais e demais componentes, o que, qualquer um com juízo sabe, que esse objetivo pode levar décadas, isto se nada mudar em termos de política, e não acontecer uma reviravolta ou afrouxamento nas políticas protecionistas. Sendo racional, o objetivo de repatriação tecnológica americana beira mais à pura retórica, do que algo que faça sentido e seja exequível. Não é possível parar o vertiginoso avanço de todas as tecnologias, do tempo, anos e anos, necessários à implantação de fábricas, dos investimentos bilionários necessários em infraestrutura, formação de mão de obra especializada, em um esforço gigante que não trará um grande número de empregos de volta, em especial para gente não altamente especializada, face à automação crescente. Há ainda os licenciamentos, direitos de patentes e outros entraves reais, até que se chegue a produzir algo.

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O recuo de Trump diante dos chineses mostra o primarismo das recentes decisões tomadas. Trump, mais que decepcionado, saiu humilhado e, passo seguinte, discretamente afastou alguns de seus assessores próximos. Entre eles o consultor comercial da Casa Branca, Peter Navarro e o secretário do Comércio, Howard Lutnick. Scott Bessent, secretário do Tesouro dos EUA, visto como a “voz da razão”, teria assumido a liderança das negociações, de agora em diante.

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Ao isentar smartphones, chips e computadores do ‘tarifaço’, principais produtos das tarifas punitivas à China, Trump admite o óbvio, isto é, que a economia americana não está preparada para substituir a complexa cadeia de suprimentos chinesa, o que todo o planeta sabe, menos ele, até esse momento embaraçoso.

Os Estados Unidos terceirizaram, desde mais de 40 anos atrás, a sua capacidade de produzir bens tangíveis, para favorecer internamente, e no ocidente, a desenfreada especulação financeira via neoliberalismo. Agora é tarde. E os Chineses certamente são mais que gratos aos gananciosos capitalistas americanos dos anos 1970, que optaram em ganhar mais dinheiro especulando no mercado financeiro, do que produzindo um automóvel, um navio ou uma lâmpada. Esses mesmos gananciosos não perceberam que as suas ganâncias não seriam impunes, que eles ensinariam à atrasada e rural China, a ser hoje a locomotiva do mundo em produção de patentes, inovação e produção industrial de bens em todos os setores. E o resultado não poderia ser outro. Empresas como a Apple passaram décadas construindo uma infraestrutura altamente eficiente na China, algo que não pode ser replicado nos EUA, sem custos exorbitantes e anos de adaptação.

Impor, de forma unilateral, um “tarifaço” ao mundo e depois recuar é uma contradição que enfraquece a narrativa de “América Primeiro”, e que sustentava a guerra comercial. Se o objetivo era pressionar empresas a trazerem sua produção para solo americano, o recuo nas tarifas envia um sinal oposto: a dependência da China não apenas persiste, mas é essencial para evitar impactos econômicos imediatos, como o aumento dos preços ao consumidor.

Trump, topetudo, sai humilhado por Xi Jinping, que ainda desdenhou declarando que a China considera o recuo de Trump sobre os eletrônicos como “pequeno passo“ para corrigir erros. Xi Jinping ainda aproveitou o momento para pedir que os EUA eliminem todas as tarifas recíprocas.

Impactos Econômicos e Políticos

Após semanas de volatilidade nos mercados globais devido ao anúncio inicial das tarifas, o recuo parece mais uma tentativa de conter danos, do que uma mudança estratégica bem planejada. Sem as isenções anunciadas, além dos preços de eletrônicos poderem disparar, aumentando a inflação americana e derrubando a popularidade de Trump, a saúde das empresas americanas de alta tecnologia seria seriamente abalada, o que já vinha acontecendo com a perda de valor de mais de US$ 10 trilhões nas bolsas de valores.

O movimento de Trump beneficia diretamente gigantes da tecnologia que têm laços estreitos com o governo. A isenção tarifária pode ser vista como uma concessão às pressões dessas corporações, levantando dúvidas sobre quem realmente está sendo priorizado: os interesses nacionais ou os lucros corporativos?

O Futuro da Política Tarifária

No final das contas, mais essa mudança abrupta na política tarifária não apenas enfraquece a posição dos EUA na guerra comercial com a China, mas também mina a credibilidade do governo Trump em casa. A narrativa de independência econômica perde força quando decisões são revertidas tão rapidamente, diante das consequências econômicas imediatas.

Enquanto tenta projetar força contra a China, Trump acaba demonstrando as limitações estruturais da economia americana e as dificuldades em implementar mudanças radicais sem causar danos colaterais significativos. Para os consumidores e empresas americanas, o alívio pode ser temporário; para a estratégia política de Trump, o dano pode ser permanente.

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